Como Surgiram as Línguas, por Charles Berlitz
Ninguém sabe como ou quando surgiram as línguas, qual foi a primeira, ou qual é a mais antiga entre as faladas hoje em dia. É geralmente aceito que a língua evoluiu a partir de uma série de sinais sonoros, tais como os utilizados pelas aves e peixes e pelos animais terrestres e marinhos.
1. Sinais de Alerta
Existem várias teorias a respeito das primeiras palavras pronunciadas por uma espécie humana emergente. Talvez a língua tenha começado com gritos de alerta para os outros, tais como "Cuidado!" "Corra!" "Aqui!" ou "Socorro!", ao se aproximar uma fera de movimentos rápidos ou pesados e desajeitados. Outras "primeiras palavras" podem ter sido instruções de caça durante um esforço de grupo ou — mais tarde — ordens do líder de um destacamento guerreiro.
Num nível mais pessoal, talvez as primeiras palavras tenham expressado um aviso ou uma ameaça para que se afastassem da comida, ou da companheira, ou das posses de um indivíduo, ou tenham avisado alguém para se afastar de uma caverna ou — como ainda fazem os animais — desafiado um rival para o combate.
2. A Teoria do Ai!
Uma outra explicação sobre os primórdios das línguas foi chamada pelos linguistas de teoria interjetiva (teoria pooh-pooh), sugerindo que nossas primeiras palavras surgiram como exclamações de desagrado, fome, dor ou prazer, evoluindo, afinal, até a expressão de ideias e emoções mais desenvolvidas. Nesse caso, a primeira palavra teria sido um "Ai!" involuntário que, na maioria das línguas, ainda sobrevive sob a forma de um "ai" ou "ow".
Enquanto as teorias sobre a origem da língua básica se referem a emergências, à caça e ao combate, as palavras utilizadas para descrever as emoções e os sentimentos espirituais são provavelmente derivadas da atribuição de sons às emoções — a teoria interjetiva. "Amor" e "ódio" são bons exemplos. Em quase todas as línguas, a palavra para "amor" tem som agradável e melífluo, enquanto a palavra equivalente a "ódio" é áspera e irritante. A mesma equiparação de som e significado é encontrada em outros pares de palavras ("bonito" e "feio", por exemplo) em muitas línguas.
3. Vozes de Animais
A teoria das vozes dos animais (teoria bow-wow) postula que a emergente raça humana estabeleceu um vocabulário inicial baseado nos sons produzidos por certos animais, como meio de identificá-los. Esse tipo de nomeação é ainda observado em referências infantis a "cocó" para a galinha, a "au-au" para o cachorro, a "piu-piu" para os pássaros e expressões como "o galinho co-co-ri-có". Gato em chinês é mao, pronunciado num tom que imita com exatidão o "miau" de qualquer gato.
Um exemplo notável da teoria das vozes dos animais que chegou até nós através dos tempos é a palavra "bárbaro", de barbaros, originalmente empregada pelos viajantes gregos da Antiguidade para designar os estrangeiros que não falavam grego, a língua da cultura, mas que soavam, ao falar suas línguas exóticas, como carneiros balindo "bée-bée".
4. Onomatopeias
Ainda uma outra explicação das origens das línguas é fornecida pela teoria onomatopaica (teoria ding-dong), que sugere que os seres humanos iniciaram sua ascensão para a linguagem através da nomeação de objetos, ações e fenômenos com um som distintivo, tal como "bum" para o trovão, "chuá" para a água, "pequeté-pequeté" para o ruído das patas do cavalo, "ruge-ruge" para o roçar das saias. A expressão japonesa pika-pika descreve bem o relampejar, do mesmo modo que a palavra inglesa boom! para qualquer explosão, inclusive a da bomba atômica.
O vocábulo que designa o processo de cunhar palavras de modo a que ecoem um som (ou para uma impressão verbal de algo que é visto) é onomatopeia, que vem do grego e significa "dar nome". Na língua dos índios chinook do estado de Oregon, Estados Unidos, a palavra para "coração" é tun-tun, descrição apropriada do ruído que faz esse órgão quando o escutamos.
5. Estímulo do Canto Coletivo
A ideia de as línguas se terem iniciado como uma evolução dos cantos ritmados que acompanham o trabalho (teoria yo-he-ho) baseia-se na crença na cooperação humana, que é certamente uma explicação idealista dos objetivos da língua. Essa teoria propõe que a língua mais antiga era constituída por cantos para estimular o esforço coletivo, fosse para mover grandes pedras a fim de bloquear a entrada das cavernas contra predadores carnívoros, fosse para carregar ou arrastar uma caça grande de volta ao aglomerado tribal ou repetir frases belicosas para inflamar o espírito de luta. É quase certo que a poesia e as canções tenham como origem esse aspecto primordial da fala. Canções dessa natureza permanecem conosco, tais como a canção dos barqueiros do Volga e as canções marinhas da época dos clíperes.
6. Da Família à Comunidade
É provável que os seres humanos tenham dado início a seus padrões de fala em pequenos grupos familiares e, então, à medida que se ampliavam seus círculos de comunicação, tenham adotado novas palavras de outros grupos. Prosseguiram assim até que se formou um vocabulário comum, ou língua básica, que demonstrou seu valor para a caça comunal ou os ataques em grupo.
7. Validade das Teorias
A língua provavelmente derivou, não de uma dessas várias fontes propostas pelos teóricos, mas de uma combinação delas. Max Müller, o famoso arqueólogo e linguista, sugeriu que o crescente desenvolvimento e complexidade das línguas seguiu-se ao desenvolvimento do cérebro humano por um período de milhares de anos.
Às vezes é possível reconhecer, nas línguas faladas hoje em dia, palavras oriundas da era neolítica. Em basco, a palavra para "faca" é um composto que se traduz como "a-pedra-que-corta", e "teto" significa literalmente "teto-da-caverna".
Fonte:
Trechos selecionados de: BERLITZ, Charles. As línguas do mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.